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EXISTENCIALISMO DEUS


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EXISTENCIALISMO DEUS



GABRIEL MARCEL



A VIDA DO FILÓSOFO

Gabriel Marcel nasceu em Paris em 1889. Foi autor e crítico teatral além de filósofo. Ele próprio designa seu pensamento como neo-socrático ou socrático-cristão. Aceitou certa feita ser chamado de existencialista cristão.

Formou-se em filosofia com vinte anos. Abandonou os estudos e dedicou-se ao jornalismo e a produção e crítica teatral. Sua melhor peça de 1932 foi “O mundo partido”. Toma clara posição, em seu Diário Metafísico, contra o racionalismo rejeitando ao mesmo tempo o cientificismo que tenta explicar o homem como coisa e a teocracia que utiliza o homem como objeto.

Passar de Sartre a Marcel é o mesmo que passar da incredulidade à fé, do desespero à esperança, do ódio ao amor, da solidão à comunidade, do nada ao ser, da obscuridade à lua. Com temperamento poético e artístico rejeita toda sistematização. Seu trabalho é em fragmentos, notas do diário, ensaios enfim.

Seu pai, conselheiro de estado e ministro da França em Estocolmo foi diretor de Belas Artes na Biblioteca Nacional, era católico e possuía um conceito severo de vida. A mãe de ascendência israelita faleceu quando Marcel estava com quatro anos. Foi criado com uma tia materna que se casa com seu pai. Esta madrasta educou-o na severa disciplina do protestantismo como meio de garantir uma convivência feliz entre as pessoas.

Marcel participou da Cruz Vermelha na primeira guerra mundial quando convive com a triste realidade da desolação e isto o levou a valorizar a existência concreta: pensar, julgar, formular, parecem-lhe traição à realidade, o que realmente conta é este indivíduo real que eu sou, com toda singularidade, que vive sua experi

ência, ele só e nenhum outro. Em 1929 converte-se ao catolicismo e testemunha no batismo: “... nenhuma exaltação, mas um sentimento de paz, de equilíbrio, de esperança, de fé.”.

Morre em 1973.


OBRAS:

Teatrais:

Um homem de Deus, 1922

mundo partido, 1932

Roma não está mais em Roma, 1951, e outras

Sua obra dramática assume o porte de obra filosófica, pois, segundo ele, “é no drama que o pensamento filosófico se apreende in concreto.”

Em 1927 funda em Paris o Jornal Metafísico onde expõe suas idéias e posições. Neste jornal Marcel descreve sua trajetória filosófica de 1913 a 1923.


Filosóficas

“Ser e Ter” (1935) – aborda a diferença entre pesquisa científica e pesquisa filosófica (problema e mistério).

“Da recusa à invocação” (1939) – encontram-se aqui os trações fundamentais de sua “metafísica da interioridade”.

“Homo viator” (1944 ) – homem itinerante reflete o sentido da vida.

“Os homens contra o humano” (1951)

“O mistério do ser” – o mais denso e sistemático de seus livros.

“O homem problemático” (1955).


O PENSAMENTO DE GABRIEL MARCEL

Partindo de sua própria existência, acentua ter vivido problemas filosóficos que o oprimiram e afirma: “a filosofia concreta nasce somente de uma tensão criadora, continuamente renovada, entre o eu e as profundezas do ser, da mais estrita e rigorosa reflexão, fundada na experiência vivida até o limite de sua intensidade”. Gabriel procura dar à existência aquela prioridade metafísica que lhe havia tirado o idealismo.

Gabriel Marcel se aproxima de Kierkegaard e Jaspers mesmo sem Ter lido algo deles anteriormente, segundo confessa. Seu existencialismo é anterior ao alemão. Sua ontologia é existencial e quer, de certo modo enlaçar-se com a tradicional. Marcel está dentro da tradição francesa não cartesiana de Pascal a Bergson e Raja.

O método de Gabriel aproxima-se de Hesserl, tomando situações concretas como as relações entre mim e outro, a representação de uma cena passada ou de uma cena à distancia, a esperança, e faz das mesmas uma análise fenomenológica aprofundada.

Motivos fundamentais do pensamento filosófico:

a defesa da singularidade irrepetível do existente e do mistério do ser, contra o racionalismo que pretende reduzir a existência à experiência conhecida pelo método da verificação empírica;

reconhecimento da inobjetividade fundamental do sentido corpóreo. O homem é um ser encarnado. Analisa a proposição “eu existo” e segundo ele, a reflexão metafísica revela que esta proposição significa “eu sou o meu corpo”. Corpo que não é só a matéria visível mas também a intimidade – concreção do eu, isto é, a individualização do existir.

A pesquisa do homem encarnado de Marcel orienta-se para a descoberta de uma sentido para a vida, o qual é sempre o sentido da minha vida. Recusar-se a esclarecer o sentido da vida é renunciar a própria identidade profunda, é dissolver-se no Ter.

O Ter e o Ser

Esta distinção é fundamental na ontologia de Marcel. TER diz respeito a coisas que me são externas e que de mim não dependem, embora eu seja proprietário e delas me disponho. SER é fonte de alheamento: os objetos que possuímos possuem significados que ameaçam tragar-nos. Os que estão apegados ao TER estão prestes a sofrer de deficiência ontológica com a perda do SER. Para quem vive na dimensão do TER todas as coisas são problemas. Exemplo: Dom Juan vive na zona do TER: vê a mulher do ponto de vista da posse e por seqüência, um mero problema, por isso passa de uma para outra sem poder saciar-se com nenhuma.

O corpo e o Ter-típico: é a exterioridade em comunicação com o “eu” interior. Entre a realidade e mim o corpo é mediador absoluto. O corpo é a primeira coisa possuída.

O SER tem a primazia na pesquisa metafísica em relação ao pensamento e ao Ter. Não há e não pode haver passagem do pensamento ao ser; esta passagem é impensável; o pensamento já está no ser e não pode sair dele, não pode fazer abstração dele. É necessário dizer que o pensamento é interno ao ser, que ele é certa modalidade do ser. O pensamento está para o ser assim como os olhos para a luz.

O Ser tem primazia sobre o Ter. O Ter é aquilo que é objetivável, é a exteriorização do ser, ele é o coisificar-se do ser, o seu vir para fora. O Ter, acentuando a si mesmo anula o ser; mas tornando-se instrumento, subirá ao plano do ser. Somente assim é que poderemos abordar o Ser sem transformá-lo em Ter, em objeto, em espetáculo, em suma, a relação Ser-Ter é uma relação de essencial tensão dialética na qual o ser está sempre ligado ao Ter e deve purificá-lo, não deixando-se absorver por ele, mas orientando-o para si.


O Ser e a Fidelidade

O Ser é o lugar da fidelidade e se faz presente na fidelidade. Marcel entrevê que a fidelidade não é fidelidade a si mesmo mas do ser sobre os outros. Nietzsche diz que o homem é o único animal que faz promessas e que a fidelidade é a mais jovem das virtudes.

O ser humano tem a faculdade de obrigar-se a si mesmo. Se prometo algo sob certa situação de desejo e noutro momento mudo o meu desejo, me forço a cumprir a promessa apesar de. Prometi ante mim mesmo. A fidelidade implica uma participação do ser no que excede minha vida e suas situações.


O Ser é disponibilidade

Estar indisponível é estar ocupado de si mesmo, é estar fechado para os outros é só estar ocupado consigo mesmo, com sua saúde, fortuna, êxito, etc.

O indisponível está sempre inquieto e isto o põe em insegurança, medo e cuidado. Na raiz da inquietude Marcel vê uma desesperança. Está fechado por trás dos muros de si mesmo e não pode esperar de mais ninguém.

Desta maneira de ser, indisponível, se compreende as raízes metafísicas do pessimismo. O ser verdadeiro é participação, é disponibilidade, júbilo, esperança, amor e fidelidade que são antídotos para o pessimismo e a indisponibilidade. Todas elas implicam em exceder-se rumo a um mais participado: Deus.


O problema e o mistério:

O problema é algo que encontro diante de mim, que posso objetivamente delimitar e reduzir. Mistério é algo em que meu próprio ser está implicado e comprometido. Diante do problema sou espectador, no mistério eu mesmo sou ator. Problema é, simplesmente um dado externo que me é proposto enquanto mistério não está inteiramente ante mim.

Todo sobrenatural é mistério mas nem todo mistério é sobrenatural. Marcel afirma que só os mistérios interessam à filosofia e estão fora do alcance do conhecimento objetivo.


DEUS NO PENSAMENTO DE GABRIEL MARCEL

“Toda fé autêntica está enraizada no ser e no mistério”. O indivíduo só se realiza quando reafirma a transcendência de Deus e sua própria condição de criatura de Deus. A fé se converte então no ato ontológico mais significativo.

Não existe o problema de Deus, isso implica em tratar Deus como objeto, como ausente. Não falamos de Deus, mas com Ele. Deus é presença absoluta. Deus só me pode ser dado como presença absoluta na adoração.

Para Marcel crer é sentir-se como no interior de Deus. Contudo a relação ao Eu Creio com a divindade, não pode ser pensada, pois trataria o crente como sujeito e a divindade como objeto. Esta relação estaria contida em um ato de fé. Ato que supõe mais do que a subjetividade. O pensar em Deus é encarado como uma relação absolutamente incluída no ato de fé.

Deus é o tu absoluto. O outro absoluto. E na fé, agora chamada invocação, eu construo a realidade do meu espírito, a minha realidade do sentir-me sendo no interior da divindade. Diz Marcel: “Eu sou mais quanto mais Deus é para mim. A crença em Deus é um modo de ser e não opinião sobre a existência de uma pessoa”. Esta transformação, plenitude que sobrevem à invocação, esta participação no amor é o ser – a forma mais alta da realidade. Este ser fala a linguagem da intimidade, de ser possuído, da plenitude, da saborosa ligação, vínculo, afeto e comunhão.

O Deus de Marcel não é objeto suscetível de demonstração objetiva (racionalismo) nem uma mera função (subjetivismo), mas o “Indemonstrável Absoluto”. O drama da existência humana é um encontro pessoal entre Deus e o eu e alterna entre o sim e o não, entre a fidelidade e a infidelidade, entre o amor e o ódio e ao homem é dado o poder único de decidir, afirmar ou negar. O dilema sempre persiste como a essência de sua liberdade.


BIBLIOGRAFIA

BATISTA, Mondim. Curso de Filosofia: os filósofos do ocidente. São Paulo, Paulinas, 1983.

GIORDANI, Mario Curtis. Iniciação ao existencialismo. Petrópolis, Vozes, 1997.

HUSMAN, Denis; VERGEZ, André. História dos Filósofos. 1982.

REALE, Giovanni; ANTÍSERI, Dario. História da Filosofia. São Paulo, Paulus, 1991.





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