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DA TEORIA À PRÁTICA
Aline Rocha
Marina Campos
Nathalia Nabhan
Roberta Assalin
Taísa Sabato
Introdução:
A sociedade atual exige, necessariamente, uma educação comprometida com mudanças e transformações sociais. Nessa sociedade contemporânea, encontra-se uma educação que, por ser social e historicamente construída pelo homem, necessita – essencialmente – do desenvolvimento de uma linguagem múltipla, possibilitando a interação de toda a diversidade, que compreende, assim, os desafios que constituem a formação profissional do educador. Esta formação se constitui em um processo que implica uma reflexão permanente sobre a natureza, os objetivos e as lógicas que constituem a concepção de educador enquanto sujeito que transforma e ao mesmo tempo é transformado pelas próprias contingências da profissão.
Pimenta (2005) diz que a educação, não só retrata e reproduz a sociedade, mas também projeta a sociedade desejada. Por isso, vincula-se ao processo civilizatório e humano. A autora complementa seu pensamento: “Enquanto prática pedagógica, a educação tem, historicamente, o desafio de responder às demandas que os contextos lhes colocam”.
Analisar a formação docente a partir da construção social e histórica do conhecimento, que se constitui por estes pressupostos, é estudar as práticas que são desenvolvidas pelo professor na sala de aula. Tais práticas pedagógicas, que fazem parte do percurso profissional de professor, é um problema pedagógico antigo, que gera grandes discussões, principalmente nos centros acadêmicos. Esta problemática refere-se à diferença existente entre a teoria e a prática.
Refletindo sobre esta questão, pergunta-se: como os saberes docentes são elaborados, re-elaborados e apropriados pelo professor? Como as discussões, análises e reflexões que ocorrem no interior dos centros de formação profissional do professor podem ser mediadas na sala de aula, campo de atuação real do professor?
Para formar a teórica deste artigo, compreende-se que o professor é um profissional reflexivo e investigativo de sua prática. Através do referencial teórico das obras de Pimenta (2005), Freire (1997), Monteiro (2005) e internacionais como Zeichner (1993), Giroux (1986, 1988, 1997), procura-se desenvolver as análises aqui presentes. Análises estas que, compreendem a formação docente como sendo construída historicamente antes e durante o percurso profissional do professor, e que, como enaltece a abordagem sócio-histórica, é também construída no social. Partindo deste princípio, pode-se dizer que esta formação depende essencialmente, tanto das teorias, quanto das práticas desenvolvidas no cotidiano escolar; eis a importância de se compreender tal interação como condição para a construção dos saberes.
A preocupação desta relação, entre teoria educacional e prática docente, vem ocupando as discussões na educação por bastante tempo. Inclusive é uma preocupação filosófica, esta relação entre teoria e prática; sendo um tema bastante presente na história da filosofia. Tendo em mente a importância de tal questão e diante disso, analisaremos a partir das contribuições dos teóricos citados anteriormente esta relação, como condição necessária à construção dos conhecimentos inerentes aos saberes dos docentes.
Uma nova prática docente.
No século XVIII, como nos informa Monteiro (2005), Kant escreve um pequeno ensaio intitulado “Entorno ao tópico: talvez isso seja correto na teoria, mas não serve para a prática”, publicado em 1793. Nesta obra, Kant analisa a posição do senso comum que julga ser evidente a separação entre elaborações teóricas e seus resultados práticos, contra argumentando que, a teoria que não responde às demandas da prática requer ser revista.
Com o objetivo de refletir sobre a diferença existente entre teoria e prática, historicamente estabelecida pela visão do racionalismo idealista, Pimenta (2005), pelo viés marxista da dialética, explicita que a atividade docente é práxis. E como tal, envolve o conhecimento do objeto, o estabelecimento de finalidades e a intervenção no objeto para que a realidade seja transformada, enquanto realidade social.
Situando o conceito de práxis dentro de uma visão marxista, podemos dizer que esta é a síntese da teoria e da prática através da ação política. Pimenta (2005) explicita o conceito de práxis a partir da contribuição de Adolfo Sánchez Vásquez, concebendo-a como uma prática que se faz pela atividade humana de transformação da natureza e da sociedade, consolidando-se, assim, em uma práxis, em uma atitude humana diante do mundo, da sociedade e do próprio homem.
Marx e Engels (1989, p.14) afirmam que: “Os filósofos se limitavam a interpretar o mundo de diferentes maneiras; o que importa é transformá-lo”. Na verdade, com esta afirmação, estes pensadores chamam a atenção para os limites da teorização em si, a qual não retém condições suficientes para promover mudanças na realidade concreta, daí ressaltar a atitude de intervir no mundo, não reduzir a ação humana à pura contemplação.
A atividade teórica por si só não leva à transformação da realidade; não se objetiva e não se materializa, não sendo, pois práxis. A prática também não fala por si mesma; teoria e prática são partes constituintes da práxis (PIMENTA, 2005).
Neste sentido, Freire (1996) complementa este pensamento, elegendo uma categoria fundamental para a efetiva realização da práxis ou de uma nova práxis. Segundo Freire, a reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação teoria-prática, sem a qual, a teoria pode tornar-se “blábláblá” e a prática “ativismo”. Giroux (1997), ao analisar obras de Paulo Freire, compartilha desta idéia quando afirma que a teoria não dita a prática; em vez disso, ela serve para manter a prática ao nosso alcance de forma a mediar e compreender de maneira crítica o tipo de práxis necessária em um ambiente específico, em um momento particular.
Diante do exposto, pode-se concluir que o desenvolvimento de uma consciência crítica sobre a relação necessária entre teoria e prática, seria o diferencial que conduziria tal relação à uma nova práxis. Portanto, o exercício da docência, enquanto ação transformadora que se renova tanto na teoria quanto na prática, requer necessariamente o desenvolvimento dessa consciência crítica. E neste sentido, pode-se dizer que o exercício da ação docente requer preparo. Preparo que não se esgota nos cursos de formação, mas, para o qual há uma contribuição específica enquanto formação teórica (em que a unidade teoria e prática são fundamentais) para a práxis transformadora.
Analisando a formação docente, a partir de um contexto prático, na perspectiva da construção de novos conhecimentos, que não se limitam ao momento da formação inicial, mas principalmente, estende-se por todo percurso profissional do professor, pode-se dizer, que a tríplice aliança do formador, do formando e do conhecimento se faz mediante uma relação dialética, sendo esta, uma característica necessária à realização da práxis. Neste sentido, Freire (1996, p.25) diz que: “ensinar não é só transferir conhecimentos”, a nosso ver, o ato de ensinar descontextualizado da práxis não transforma; assim, concordamos com este autor quando diz: “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”.
O que chama a atenção é que: a práxis é desejada, é necessária, visto que contribui para a emancipação de uma nova ordem social. Porém, apesar das propostas dos teóricos, entidades oficiais com competência no campo da educação e por professores e outros profissionais da educação, o alcance político transformador da práxis tem sido insatisfatório diante das questões sociais e culturais da sociedade em geral. O discurso quase sempre está na fala do formador, mas não está na sua prática.
Quando falamos em formador, envolvemos os três níveis de ensino (fundamental, médio e superior). Diante desta realidade nos perguntamos: Qual o motivo para tal disjunção?
Tendo como parâmetro a história da educação brasileira, podemos dizer que os processos de formação de professor foram fortemente influenciados pela racionalidade técnica. Neste sentido, é necessário que analisemos esta influência, sob a ótica de teóricos críticos como Giroux (1988), Zeichner (1993), Pimenta (2005), e outros.
A literatura que discute a interação entre teoria e prática é vasta. No entanto, apesar dos avanços obtidos nas discussões no campo literário, nas pesquisas e os estudos, todo esse teorizar nos mostram que na realidade, nos encontramos ainda, em um estágio muito distante da práxis desejada. Segundo Giroux (1988 p.23), a resistência à concepção e assimilação da educação como práxis justifica-se pelas implicações da racionalidade técnica, que se tornou uma herança cultural impregnada na mente humana e, conseqüentemente, nas instituições de ensino. Segundo este autor, as instituições de treinamento de professor e as escolas públicas têm, historicamente, se omitindo em seu papel de educar os docentes como intelectuais. Em parte, isto se deve à absorção da crescente racionalidade técnica, que permeia e fundamenta o modelo de sociedade contemporânea, que separa a teoria e da prática, contribuindo para o desenvolvimento de formas de pedagogia que ignoram a criatividade e o discernimento do professor.
Na visão da racionalidade técnica, o professor tornou-se apenas o executor de programas previamente elaborados por outros, os “especialistas”. Zeichner (1993) ao considerar que as orientações voltadas para a formação do professor estão envolvidas por uma concepção de ensino em que, este, é tido como uma “ciência aplicada”. Assim, para os futuros professores, os conhecimentos, conteúdos e habilidades necessários à sua formação docente são limitados e totalmente determinados antecipadamente por outros. Neste contexto, o futuro docente é considerado principalmente, como um recipiente passivo de um conhecimento profissional e que desempenha um pequeno papel na determinação de seu programa de preparação.
Fiorentini, Sousa Jr. e Melo (2003), fazem referência a Elliot (1993) ao enfocar sua fala sobre a percepção que os professores têm em relação aos conhecimentos teóricos produzidos pelos especialistas ou pelos pesquisadores universitários, afirmando que os vêem como uma ameaça, porque são elaborados por um grupo de estranhos ao processo educativo, que se dizem especialistas na produção de conhecimentos válidos sobre suas práticas educativas.
Diante disso, consideramos que as racionalidades técnicas, positivistas, trouxeram historicamente limites para o desenvolvimento profissional do professor e, conseqüentemente, para o desenvolvimento de uma sociedade que almeja e busca mudanças no contexto social, político e cultural, visto que, os princípios básicos eram permeados e, incorporavam conteúdos formais, cristalizados em grades curriculares, não valorizando, dessa forma, a criatividade e a inovação do professor.
Pimenta (2005, p.26) afirma que o saber docente não é formado apenas da (e na) prática, sendo também nutrido pelas teorias da educação. Dessa forma, a teoria tem importância fundamental na formação dos docentes, pois dota os sujeitos de variados pontos de vista para uma ação contextualizada, oferecendo perspectivas de análise para que os professores compreendam os diversos contextos vivenciados por eles. Buscamos fundamentação teórica em Pimenta (1996) e Freire (1996) para tratar do problema sobre os saberes docentes que são apropriados e produzidos pelo professor mediante as práticas pedagógicas reflexivas e investigativas. Estes dois autores procuram a reflexão sobre a necessidade do domínio e também da interação entre os saberes para o desenvolvimento de uma prática pedagógica autônoma e emancipatória.
Pode-se perceber que, a visível falta de unidade entre os saberes docentes, geram uma prática pedagógica frágil, que é não crítica e que, conseqüentemente, não transforma, não constrói, mas sim, limita-se a reproduzir as representações sociais de uma classe hegemônica da sociedade. Os cursos de formação de professores têm se posicionado diante dos saberes e também tem mostrado consciência no fato de que o desafio mais importante para o futuro professor é conhecer, por um lado, as teorias implícitas na sua própria prática e, por outro, mediar ou promover condições para que diante das teorias, este profissional modifique suas concepções, posturas, crenças e ações na prática educativa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS:
• FIORENTINI, Dário; SOUSA JR., Arlindo José; MELO, Alves Gilberto F.. Saberes docentes: um desafio para acadêmicos e práticos. In: GERALDI, Corinta M. G.;
• FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996;
• GIROUX, Henri. Teoria crítica e resistência em educação: para além das teorias de reprodução. Petrópolis (RJ): Vozes, 1986. pg.548-249. Cortez, 1988;
• MARX, Karl; ENGELS, F. A ideologia alemã. São Paulo: Hucitec, 1989;
• MONTEIRO, Silas Borges. Epistemologia da Prática: O professor reflexivo e a pesquisa colaborativa. In: PIMENTA, Selma Garrido; GHEDIN, Evandro (Orgs.);
• ZEICHNER, Kenneth. M. A formação reflexiva de professores: idéias e práticas. Lisboa: Educa, 1993. pg.12-52.
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