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A ‘CONFUSÃO’ DOS SÉCULOS

Vinicius dos Santos Xavier

Num grande surto, com algo estranho ocorrendo, sou convocado a lecionar na França. Ao chegar, tomo ciência do ocorrido: a morte de Jean Hyppolyte faz com que a cadeira fique vaga e necessite de um substituto. No caso, pensam em vários nomes, mas, aquele que mais se destaca é Xavier, precisamente, Vinicius Xavier: um eminente filósofo brasileiro que percorre todos os ramos e rumos da filosofia. Considerado o ‘perfeito’ a ocupar o lugar de outro grande filósofo que falecera. Chego à França no dia anterior que começaria a lecionar. No dia em que começo, precisamente 20 de outubro de 2007, adentro a Universidade e sou convocado por um senhor, baixo e um tanto quanto gordo, a dirigir-me diretamente à sala de aula. Aquele senhor começa a fazer perguntas e a questionar-me sem paradas para respirar ou pensar muito na resposta. Nem seu nome eu sabia, porém, parecia que eu o conhecia de algum lugar. Mas, sem oportunidades para questioná-lo sobre, ao menos, seu nome.

Chegado à porta da sala de aula, o senhor pede para que eu entre e diz: “Sócrates...”. Atônito, adentro a sala e... Perplexidade!

* * * A sala não era como uma sala qualquer. Era uma sala, para meus olhos do século XXI, um tanto quanto ‘estranha’. Não havia lousa, giz, caneta ou qualquer coisa do tipo. Havia cadeiras e uma extensa mesa. Todos sentados, menos dois deles: eram os outros professores da Universidade. Quando estes se viram para mim, fico surpreso e penso ser um sonho. Eles se apresentam, respectivamente: “Bom dia. Sou Karl Heinrich Marx...” Eu o interrompo e digo: “Sim. Eu conheço muito bem o senhor, mas...” O segundo me interrompe e diz: “Não fique perplexo, amigo Xavier. Ah! Desculpe-me. Sou Espinoza. Benedict Baruch Espinoza”.

Sim! Eram dois dos maiores filósofos dos séculos e séculos de filosofia! Como eu, respeitado filósofo brasileiro, poderia não conhecê-los?! Mas, o mais interessante: eles não significavam nada perto de nossos alunos...

Olho para a sala, naquela disposição em que ela se encontrava, e vejo: os séculos são alunos e os alunos perpassam todos os séculos. Todos em disposição, sentados e atentos a algo...

* * * Nessa confusão, o mais ‘bagunceiro’ era Heráclito de Éfeso, que não parava em seu lugar: estava sempre em movimento, e só dava para ouvi-lo dizer: “...isso já não é mais o mesmo”. Agostinho dizia do tempo e sobre Deus, junto a Descartes que discordava, enquanto jogavam baralho (porém, demoraram muito até que começassem realmente a jogar, pois, Descartes dizia que só começaria a partida assim que as regras fossem-lhes ‘claras e distintas’). O Profº Espinoza dizia algumas coisas e, entre elas, reiterava que estava certo com sua grande máxima, mais ou menos assim: “Democracia é o desejo de todos de governar e, ao mesmo tempo, não ser governado”. Dizia ele que esta foi a ‘missão cumprida’ de todos os filósofos durante os séculos. Marx concordava e completava dizendo que, agora, todos se reconheciam enquanto ‘práxis’...

Nisso, Eu começo a falar e todos prestam atenção em alguma coisa (menos Heráclito, que ninguém sabia onde estava). Tales, ao lado de Platão, que o acompanhava, olhava para o alto, enquanto Aristóteles discutia junto à Marcuse, Adorno e Horkheimer... Nietzsche e Schopenhauer discutiam e diziam que nada disso tinha sentido (ou algo parecido). Continuei falando e começamos a dialogar. Parmênides estático... E Zenão esperava que a Tartaruga ganhasse a corrida... Hegel pergunta ao Profº Marx sobre a dialética... Retomo uma conversa com Feuerbach e começo a explicar o conceito de alienação. Kant nos interrompe dizendo que, como é tudo ‘fenômeno’, ele não conseguia entender a ‘aula-em-si’... Anaximandro reclamava de sua visão. Dizia que não conseguia distinguir nada, que tudo era confuso e parecia ser apenas um. Ele chamou isso de “Apeíron”...

Jean-Paul Sartre discutia com Maurice Merleau-Ponty (enquanto Camus tentava conquistar Hannah Arendt) sobre o Ser e a existência. Heidegger interrompe-os e diz: “Eu-aqui, Tu-aí, Ele-lá”. Foucault e Deleuze conversam sossegados ao fundo sobre poder, controle e etc...

* * * Ao final da aula, tudo conversado e nada resolvido. “Sim! Este é a grande questão que nos fará voltarmos sempre para essa grande aula”, dizia Eu sabiamente. E, assim, fomos todos brindar o Grande Acaso do Universo...



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