“Sombras de Ventania”

          Em uma noite aparentemente comum de 1852, a vida da família Morgan é drasticamente alterada com o assassinato de Ana por uma misteriosa criatura que vagueia despretensioso ao luar. Logo, as antigas relações de obsessão e ódio existentes entre eles começam a aflorar, criando impasses entre os mais nobres sentimentos humanos, e os instintos naturais: como a luta pela sobrevivência, e a busca por contentamento. Apesar da fantasia contida no romance, cada uma de suas linhas consiste em demonstrar a disputa entre as trevas e a luz, travada na alma de cada um dos seres...

           Tornei-me as trevas que um dia temi, e me incorporei á escuridão noite após noite assombrado pela minha insensatez. Os ventos que antes faziam chorar, agora me acalmam, e fecham-me os olhos. Embora todo o tempo pense na morte, vida ecoa em meus ouvidos: cada respiração, cada passo, cada toque... Tudo fala.
           A solidão faz-se mais confortável que a multidão, pois adormeço em meu pecado fatídico. Preso em meu pensar, durante alguns minutos ainda sinto a mortalidade, e isso devo a maldita morbidez a qual me submeto quando o ócio me toma por inteiro. Nem a chama da lareira é capaz de aquecer estas minhas mãos, que frias procuram amparo em corpos cheios de vida, entregando-me ao vazio do silêncio, e é como se tudo tivesse sido sempre assim.
(...)
           Parece loucura acreditar, mas quando o céu noturno e límpido; de repente se tornou nublado, e a chuva começou a cair, era como se sentisse lágrimas escorrendo sobre meu corpo. E soube então, naquele momento que ele ainda está vivo: aquele cujos cabelos são as árvores de um eterno Outono.
          Talvez este Outono, permita ao sol ascender um dia, mesmo ralo. Era nisso que você acreditava, e somente por você, irei também acreditar.

          Amanda Alcântara nasceu em São Paulo, em Novembro de 1992. Atualmente é aluna do curso de Filosofia da Universidade Mackenzie, e desenvolve um projeto de pesquisa mediando as relações entre o Ultrarromantismo brasileiro e as Cartas do filosofo Pedro Abelardo e Heloísa, escritas no período Medieval. É fã de cinema, e leitora ávida dos clássicos do romance e do terror, de onde costuma obter inspiração para a escrita.

“Filosofia e Literatura”

           Filosofia e Literatura são duas atividades do fazer humano que caminham juntas desde os primórdios da cultura ocidental: desde Homero, a filosofia se entrelaça com a literatura, abre questões e amplia horizontes por meio das narrativas dos seus expoentes.
           Ademais, mesmo que a antiga premissa – de que nem todo literato é um filósofo e nem que todo filósofo é um literato – seja verdadeira, o fato é que muitos pensadores têm se valido das formas literárias para fazer filosofia produzindo poemas, mitos, romances, crônicas e outros.
           Ora, se a filosofia se ocupa com o conhecimento das coisas divinas e humanas, das origens e as causas de todos os fatos (Cícero), e é uma reação ao mistério da realidade, especificamente o da vida humana e seu destino (Unamuno), filosofia e literatura estão indissociavelmente unidas, visto que ambas “dão o que pensar” (Deleuze), permitem o vislumbre “daquilo que se sabe e do aquilo que se pode saber” (Zambrano). Tendo sempre em conta a afirmação de Platão de que filósofos são aqueles capazes de atingir o que sempre existe de maneira imutável; e a declaração de Albert Camus que um grande escritor sempre traz consigo seu mundo e sua prédica. E é exatamente por isso que a literatura compartilha uma fronteira comum com a filosofia. Que não é fixa, nem imóvel, mas dinâmica e ativa. Como a linha, a fronteira, que separa a água do mar da areia da praia.