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O mundo como vivacidade e transfornação.

Gyorgy Laszlo G. Filho

1

É no mínimo estranho ver o que acontece quando se mistura uma mãe que pensa com um pai que se ajoelha. O caso que será contado agora apresenta este enorme paradoxo encarnado num insólito filho...

2

A criança já nasce em meio a discussões fervorosas: qual será o nome do menino?

A mãe quer Frederico, ou mesmo Dionísio. O pai sonha com um filho chamado Pedro, ou José. “Se você quer nome bíblico, diz a mãe para provocar o marido, só aceito se for Leviatã ou Saulo!”.

Após muita reflexão – que envolve ameaças, gritos e vasos quebrados- chegam ao nome Diógenes -o “cínico” para a mãe, o “filho de Deus” para o pai.

Assim o fedelho cresce, sempre nesta mesma corda bamba: de um lado a eternidade congelada, do outro, o calor perecível.

Sem nunca decidir para qual lado deseja cair, é obrigado, quando chega à idade certa, a fazer a crisma, pois “filho meu não vai para o inferno por irresponsabilidade do pai!”. A mãe, para tranqüilizá-la, diz que “não se preocupe, você faz o que seu pai pede, só para deixá-lo feliz, nem precisa ouvir o que o padre fala, metade é baboseira, metade é má tradução”.

O filho -que até então desconhecia o interessante rumo que sua vida levaria- vai, acaba por gostar dos ensinamentos religiosos -para desgosto da mãe-, e começa a sonhar com o celibato -para satisfação do pai.

Mas num belo dia, após ter sonhos estranhos e tortuosos, no qual se metamorfoseara num gigantesco inseto, Diógenes acorda com seu mesmo corpo, mas com uma estranha sensação de formigamento... Ele levanta e se olha naquele gigantesco espelho esculpido em ouro, todo ornamentado com detalhes barrocos. Ali, vê dois Diógenes se encarando, absurdamente iguais um ao outro. Suas mãos encostam-se às mãos suas e nesse momento há um instante estrondoso: ladram os covardes cães cascudos na calçada e o reflexo confunde-se com o ser refletido...

3

O que aconteceu de tudo isso? Vocês logo saberão, mas o importante é dizer que nem pai nem mãe gostaram do resultado, pior ainda para os empregados...

4

Diógenes acorda deitado no chão. Quando se levanta sente um estranho incomodo por todo o seu corpo, subitamente arranca todos os pedaços de pano fofo e aromatizado que o envolviam até então. “Ah, agora está bem melhor...”.

Sai pela porta de carvalho como entrou no mundo, no corredor ele sente aquela rotineira vontade de eliminar seus dejetos, mas, ao invés de correr para o acento límpido e lustroso, satisfaz-se sobre os tapetes persas da sala. Na parede, Monalisa, com seus olhos enigmáticos e desaprovadores, observa-o.

Diógenes pela primeira vez sente o odor daquilo que ele identifica como o seu “verdadeiro cheiro”. Não demora muito e a curiosidade de se misturar com aquilo que ele identifica como seu “verdadeiro ser ontológico” vem, e ele, sem pensar, deita e rola por sobre o tapete... Uma das criadas aparece, e vendo a bizarrice da cena, derruba a bandeja que trazia o café da manhã de seu senhor. Diógenes, fezes e alimento se misturam em um único ser.

Enquanto a criada corre por entre os inúmeros corredores da mansão, Diógenes sai para o quintal. O Sol estalado no céu e as flores mais cheirosas do que nunca fornecem a este espetáculo dantesco um ar campestre, e a estrela dele, apoiada em seus quatro membros, comendo todas as delicadas pétalas do jardim de sua mãe, dá a esse espetáculo absurdo um ar mais absurdo ainda.

Diógenes então avista, por detrás de uma linda e trabalhada cortina, um lindo e gigantesco vaso feito pelos escravos de algum artista cuidadoso. Dentro dele encontra seu verdadeiro lar que ele apelida de “coisa-em-si”, visto que conseguiu vê-la através do maltrapilho véu que encobre nossos sentidos.

Ali ele achou a verdadeira essência de todo o mundo e riu, riu como nunca havia rido antes, que essência mais simples era aquela! Ah, se os filósofos conseguissem vê-la, não perderiam seus preciosos tempos dissertando por páginas e mais páginas sobre o nada, cujas elucubrações só mostravam o quão bom eles eram em argumentar sobre o que não sabiam...

5

Quando Diógenes finalmente se acalmou, o pomposo mordomo, cujo nariz de tão comprido e empinado, quase permitia observar sua garganta -fato que o jovem Diógenes na aurora de sua infância não deixava passar despercebido- perguntou com aquela voz engomada:

-O senhor está com algum problema?

-Um enorme problema.

-Posso ajudá-lo, senhor?

-Nobre ser, o que o homem deve preferir, comer depois dormir, ou dormir depois comer?

O mordomo, tentando encobrir o espanto frente a tal pergunta, racionaliza a questão da maneira como pode e balbucia algumas palavras, que Diógenes não pode ouvir, visto que estava encantado com a rima que acabara de fazer.

Depois de ficar muito incomodado com o silêncio que rodeava a ambos, o mordomo resolve perguntar o que estava tão acostumado: “O senhor deseja algo?”

Mas a resposta foi bastante diferente: “Sim, desejo que se afaste do meu sol!”

6

Não demorou muito e Diógenes desejou alcançar a rua, queria caminhar pelas calçadas sem rumo algum, perder-se nos labirintos da malha urbana, ver os astros que passeiam pelo mundo afora...

Coitado, na primeira avenida que cruzara, quando se preocupava com a anatomia de roliças pernocas, foi pego por um gigantesco ser metálico, cuja frente se destacava por uma brilhante estrela.ervorosas: qual sera este enorme paradoxo.



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