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VIOLÊNCIA INFANTIL E SEU IMPACTO NA VIDA ESCOLAR:
REVISÃO DE LITERATURA


Aline Fabro Buonacorsi
alinefb00@gmail.com

Profª Drª Gina Valbão Strozzi
ginastrozzi@mackenzie.br

Resumo: A violência infantil existe desde o início das civilizações e vem assumindo assustadores índices de crescimento na atualidade, o que resulta de um processo que banaliza as formas de vitimização da criança. A partir dessa afirmativa, surgiu o interesse de pesquisa que embasou o meu Trabalho de Graduação Interdisciplinar – TGI – do curso de Pedagogia, orientado pela Profª. Drª. Gina Valbão Strozzi. O estudo em questão levantou aspectos da violência doméstica, estrutural e escolar, relacionando às conseqüências e às dificuldades de relacionamento que a criança tende a apresentar.

INTRODUÇÃO

No primeiro capítulo do TGI intitulado “Violência e Relações Estabelecidas com a Infância”, há uma ressalva dos costumes de países como Grécia e China, que sacrificavam ou puniam suas crianças em nome de tradições e crenças, chegando ao Brasil, em que a violência foi introduzida pelos jesuítas, que as castigavam em nome da educação e da moralidade. Em face disso, estabelece-se uma necessidade de conhecer a abordagem da infância através das épocas, considerando-a primeiramente como uma fase inacabada e preparatória para a vida adulta, ou seja, o indivíduo como um vir a ser, a criança como um mini adulto.

Estudiosos da área afirmam que as classificações dependiam de uma série de fatores, como sociais, econômicos e de contexto histórico.

Após alguns anos de esforço, o Brasil vem consolidando uma visão de criança como sujeito de direitos, participante e produtora de cultura e história. GHIRALDELLI (1997) contribui para a compreensão da infância na atualidade, afirmando que a modernidade vem criando a concepção de criança como um ser diferente, em contraposição a concepção de adulto em miniatura.

VIOLÊNCIA INFANTIL

Relacionando com a evolução da infância, inicia-se a abordagem da violência estrutural, em que o indivíduo faz parte de um contexto social que o influencia de forma positiva ou negativa. Alguns exemplos citados a seguir, ilustram essas vitimizações. Em primeiro lugar, o trabalho e mão de obra infantil, que submetem a criança a condições exploratórias e muitas vezes desumanas, envolvendo no Brasil além da evasão dessa criança na escola, baixa preparação e questões de sobrevivência de famílias, já que não há qualificação e atualização para o trabalho e a condição econômica do país favorece a procura de todos os meios possíveis para garantir o sustento.

Se acrescentarmos que as escolas, tradicionalmente mencionadas como uma alternativa, estão freqüentemente em mau estado, com poucos recursos e professores não qualificados, é possível entender que mesmo muitas das crianças trabalhadoras são ativas ao defender a situação que idealmente não deveria existir. (NASCIMENTO, NETO & SAETA, 2007, p.52)

Em segundo, a delinqüência que “força” ou “estimula” a criança a participar de conflitos armados, guerras de tráfico e gangues, sendo que estas muitas vezes conhecem a criminalidade desde o nascimento e reproduzem o comportamento de pessoas próximas.

Uma vez que a guerra ocorre em sua região, as crianças e jovens não podem evitar tomar parte do conflito, em primeiro lugar como vítimas diretas e em segundo lugar como agentes conscientes. (NASCIMENTO, NETO & SAETA, 2007, p.54)

De difícil delimitação, a violência escolar envolve além dos papéis dos funcionários e dos alunos, diferenças de etnia, idades e gênero.

Ao tratar-se desse tipo de violência, devemos nos reportar a violência física, moral, ética, política e principalmente a violência simbólica. Essa vitimização se inicia com a defesa do patrimônio, pois o espaço que era visto como de lazer, passa a ser invadido e explorado por diferentes grupos e, como forma de recuo levantam os muros, pregam as carteiras no chão, colocam grades nas janelas e assim por diante, violentando a liberdade dos educandos e da comunidade escolar.

Ao entrar na escola encontram-se castigos físicos e morais, condutas pedagógicas disciplinadoras e absurdas e agressões verbais de diferentes tipos. Ameaças, negações, privações e rótulos são comuns no cotidiano escolar e fazem com que os alunos se tornem introspectivos, inferiorizados e bloqueados intelectualmente.

Por último, destacam-se as relações que durante o período da infância, a criança estabelece com a família, sendo essa responsável pelo desenvolvimento integral desse individuo, podendo torná-lo apto ou desqualificado para viver em sociedade.

A família deve ser um modelo a ser seguido, e a partir do momento em que esses parâmetros se desestruturam, podem-se configurar atos agressivos e violentos que ocasionam muitas vezes a violência doméstica, definida como:

Todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis, contra crianças e adolescentes que sendo capaz de causar dano físico, sexual e / ou psicológico a vítima – implica de um lado uma transgressão do poder / dever de proteção do adulto e, de outro, uma coisificação da infância, isto é, uma negação ao direito que crianças e adolescentes têm de serem tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvimento (AZEVEDO, 1995, p. 36).

As relações entre vítima e agressor nesse caso, são bem mais complicadas já que existe confiança, medo e afeto envolvidos. Nesse contexto são reconhecidos quatro tipos de vitimizações.

A violência física é entendida como dano físico a outra pessoa, sendo intencional ou não, que pode causar desde uma leve dor até o óbito. Esta é mais fácil de ser identificada devido a lesões no corpo, porém ainda é a mais aceita, pois é vista como forma de educar os filhos. Dentre as suas práticas pode-se destacar o bater, beliscar, espancar, puxar cabelos etc., ou seja, tudo que vai desde ‘o tapa’, até o espancamento, ocasionando ou não a morte.

Na violência sexual, a criança sempre é vítima, já que não tem maturidade emocional para consentir um ato sexual. Ela é entendida quando um adulto usa de uma criança como forma de estimulação direta ou indireta para obter prazer sexual, podendo ela resultar de um contato físico ou não.

Conforme AZEVEDO e GUERRA (1988), ela pode ser classificada de acordo com três grupos:
- Não envolvendo contato físico: abuso verbal, telefones obscenos, vídeos / filmes obscenos, voyeurismo;
- Envolvendo contato físico: atos físico – genitais que incluem “passar a mão”, coito (ou tentativa de), manipulação de genitais, contato oral genital e uso sexual do ânus, pornografia, prostituição infantil e incesto;
- Envolvendo contato físico com violência: estupro, brutalização e assassinato – no qual estão presentes a força, ameaça ou intimidação.

Já a violência psicológica resulta de inferiorização e bloqueio de pensamentos e sentimentos de uma criança, envolvendo principalmente gestos e humilhação, que afetam diretamente a auto-estima da vítima.

Para os órgãos de saúde do nosso país, ela pode ser entendida como uma ofensa verbal, de forma repetida, reclusão ou privação de recursos materiais, financeiros e pessoais.

Não menos importante, a negligência consiste em não prover condições necessárias para o desenvolvimento dos filhos, variando de aspectos médicos, higiênicos, de supervisão, escolares e físicos.

Ainda nesse capítulo, encontram-se algumas leis em prol dos direitos da infância que vêm ganhando força nos últimos tempos, destacando-se a Declaração dos Direitos da Criança que traz dez princípios fundamentais para seu desenvolvimento, a Constituição da República Federativa do Brasil que prevê como dever da família, da sociedade e do Estado, o seguro a vida, saúde, alimentação, educação entre outros, os deixando livres de qualquer forma de discriminação, violência ou opressão e o Estatuto da Criança e do Adolescente que dispõe a função dos papéis sociais e as conseqüências de ações e omissões contra crianças e adolescentes.

REVISÃO DE LITERATURA

Após essa contextualização histórica do objeto, dá-se início a uma revisão de literatura em que os principais estudos das bases de dados Scielo e Bireme e de teses das Universidades Mackenzie, PUC e USP são selecionados, respondendo a questões de tipos de violência, impactos causados a criança e sua condição de vida e possíveis encaminhamentos de diferentes áreas e profissionais especializados.

Sendo assim, no segundo capítulo do TGI intitulado “Entendendo a violência infantil a partir da literatura: 1990 e 2008”, pode-se ter acesso a diferentes pesquisas na vertente doméstica, estrutural e escolar, lembrando a ausência de estudos significativos nas áreas citadas.

Para a violência doméstica, são trazidos alguns estudos de caso e perfis de famílias que sofrem abuso, ressaltando a prevalência de justificativas de educação e bons costumes para a vitimização.

Nesses relatos, as condições familiares e econômicas são fatores determinantes para sua ocorrência, porém não são os únicos, já que relações culturais e discriminantes também fazem parte dessa esfera.

Não faltam estudos que denotem os diferentes papéis da família e as relações de poder nela inseridas, podendo ocasionar a desigualdade com fins de dominação e opressão.

Muitas vezes essa violência é banalizada devido a ações da mídia que expõe a violência urbana de forma mais devastadora que a doméstica, e só a considera grave no caso de lesões aparentes ou óbito.

Muitos também afirmam que ao passar por algum abuso, essa criança terá grandes chances de reproduzi-lo na vida adulta.

O diagnóstico desse abuso pode ser obtido através de situações cotidianas, como brincadeiras e conversas, porém a denúncia afeta não só criança como todo o equilíbrio familiar, pois há dissolução dos vínculos e apoio afetivo e psicológico dos demais.

Todos os levantamentos fazem menção ao reconhecimento dessas vítimas, por profissionais de diversas áreas e notificam posturas para o enfrentamento desse problema, além disso, há indícios orgânicos que favorecem a identificação, como desconfiança dos adultos, dores e problemas físicos, regressão a comportamentos de fases anteriores entre outros.

Ultrapassando a esfera familiar, encontram-se as relações sociais e as questões de superioridade e poder, enquadradas diretamente na violência estrutural.

Há menção a contribuição do Estado na criação e manutenção das diversas violências, transparecendo isso também aos meios de comunicação que enfocam a transferência de responsabilidades desse órgão para a sociedade civil.

Alguns autores também relacionam essa violência à classe social, lembrando que ela não é o único fator, mas faz parte do processo, embasando isso em alguns questionários e estudos de caso.

Quanto ao trabalho infantil, o levantamento reconhece a autenticidade da influência econômica na vida das famílias que buscam essa “solução” e também discrimina o papel das indústrias que usam de mão de obra ilegal em prol de altas produções a custos mais baixos.

Ainda como forma de trabalho, encontra-se a prostituição infantil, em que a criança é explorada socialmente e usam de seu corpo como meio de obtenção de prazer sexual.

Alguns estudos fazem uma própria revisão do conteúdo de jornais de grande circulação no estado de São Paulo, pontuando que existem algumas matérias informativas e que, as pessoas só se dão conta do que ocorre no cotidiano, quando uma dessas notícias vem a público.

Na mesma vertente, define-se a pedofilia geralmente desencadeada através de uma rede e o papel do abusador, sendo esse o perfil estereotipado, de estrangeiro, rico, que troca fotos de crianças pela internet e que deve ter sofrido algum trauma.

Na esfera escolar, autores relembram questões de patrimônio e seriedade das instituições escolares, além de autoridade demasiada dos professores, que usam de seu “poder” como forma ameaçadora e se não dão conta dos alunos ou de determinado problema, encaminham a situação a coordenação ou direção pedagógica.

A violência ao redor da escola reflete diretamente no cotidiano escolar, embasando relações de discriminação a autoridade.

Além de relações entre alunos e espaço e alunos e professores, existem as relações de aluno x aluno, que norteiam os relatos sobre bullying, uma forma de agressão intencional e repetida que ocorre sem motivo aparente, que leva um aluno a situações constrangedoras perante outros.

O enfrentamento desses abusos por profissionais da educação se dá de diferentes formas e conforme referência varia de educadoras de escolas públicas e de escolas particulares.

O desconhecimento do Estatuto da Criança e do Adolescente também é mencionado, já que no caso de suspeita ou confirmação, a maioria das professoras, segundo questionário aplicado, não sabia como agir e tomaria decisões precipitadas, comprometendo a segurança da vítima.

Além disso, a função do Conselho Tutelar pouco é esclarecida e profissionais de justiça são extremamente leigos no assunto, tratando-o de acordo com o senso comum e de forma técnica e reducionista. Durante as considerações finais, pode-se estabelecer um parâmetro entre os tipos de violência e os impactos causados ao desenvolvimento escolar da criança vitimizada, ressaltando que o enfoque é dado a escola visto que é um lugar privilegiado na identificação de abusos, já que envolve interação e socialização dos alunos.

O não envolvimento, a negação ou indiferença de profissionais especializados podem gerar desestímulo e a sensação de não preocupação com as ações dos próprios alunos, além de produzir um dano psicológico adicional à vítima, já que ela se sente culpada e desacreditada perante a história tão dificilmente apresentada.

Perceber e monitorar as habilidades ou possíveis dificuldades que possam ter os alunos em seu convívio social com os colegas e demais passa a ser atitude obrigatória daqueles que assumiram a responsabilidade pela educação, saúde e segurança de seus alunos. (NETO, 2003, p. 9)

Á guisa de conclusão, é importante considerar que o estímulo na formação de educadores para identificação e encaminhamentos dessas crianças, evita o abuso e garante o desenvolvimento saudável em um ambiente confiante.



REFERÊNCIAS

AZEVEDO, M.A. e GUERRA, V.N.A. Pele de asno não é só história: um estudo sobre a vitimização de crianças e adolescentes em família. São Paulo: Roca, 1988.

AZEVEDO, M.A. Violência doméstica contra crianças e adolescentes: compreensão do fenômeno no Brasil. São Paulo, 1995 (mimeo)

GUIRALDELLI Jr, P. (org) Infância, escola e modernidade. São Paulo: Cortez, 1997.

NASCIMENTO, M.L.B., NETO, J.C.S. e SAETA, B.R.P (orgs). Infância: violência, instituições e políticas públicas. São Paulo: Expressão e Arte, 2007.

NETO, A. A. L. Bullying – comportamento agressivo entre estudantes. Porto Alegre, 2005. Disponível em www.scielo.br – acesso em 23/09/2008.



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