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O TEMPO EM ARISTÓTELES


Nereide Siqueira Campos da Silva


Aluna do Curso de Filosofia da Universidade Mackenzie






Introdução

Não é possível falar do tempo sem fazer perguntas que já foram feitas inúmeras vezes por quem se propôs a discuti-lo. Indaga-se sempre o que seria o tempo real, o tempo que temos de vida, o tempo que as coisas duram, o tempo do relógio, a falta de tempo, e porque muitas vezes temos a sensação que o tempo passa muito rápido e em outras vezes passa devagar? Mas o que seria de fato o tempo? O tempo é subjetivo? Estaria o tempo em movimento? Este trabalho tem a intenção de expor o que era o tempo para Aristóteles, e como ele chegou a suas conclusões.

Desde os primórdios o homem tem a necessidade de explicar o mundo em que vive e tudo a sua volta, oprimido pelo tempo tenta compreende-lo e às vezes segura-lo, pois em muitos momentos tem a sensação que ele irá acabar. Aristóteles relacionou o tempo com o movimento e também com a alma. Será que o tempo está totalmente dependente desses dois elementos? A alma seria condição fundamental para a existência do tempo? Primeiramente existe a necessidade de se determinar a ciência a ser observada. O tempo está na segunda parte de sua obra a Filosofia Natural, especificamente na física. Veremos que para Aristóteles existiam algumas condições necessárias para se perceber o tempo. A partir deste filósofo vemos que a filosofia passa a um momento essencialmente materialista e lógico.


O Tempo segundo Aristóteles

Há uma brincadeira de criança que diz: “o tempo perguntou ao tempo quanto tempo o tempo tem, o tempo respondeu ao tempo, que o tempo tem quanto tempo, quanto tempo o tempo tem”. Então o tempo seria eterno? O filosofo grego Aristóteles nasceu em 384 a.C. e morreu em 322 a.C. e sua filosofia e idéias até hoje influenciam a humanidade. Dentre os inúmeros estudos a que se dedicou, (lógica, filosofia, física, astronomia, biologia, psicologia, política e literatura) também estudou o tempo. O filosofo explicou o tempo de uma maneira racional, através da física. No Tratado do Tempo, que se encontra na física, estaria à definição mais precisa do que é o tempo. A filosofia segunda de Aristóteles trata da matéria sensível, onde a característica do mundo sensível é a substância móvel, desta forma ele não acreditava em uma alma supra-sensível, como seu mestre Platão dizia crer. Suas investigações partiam da - Observação fiel da natureza “Platão, idealista, rejeitara a experiência como fonte de conhecimento certo. Aristóteles, mais positivo, toma sempre o fato como ponto de partida de suas teorias, buscando na realidade um apoio sólido às suas mais elevadas especulações”. Para analisarmos o tempo em Aristóteles, antes de tudo verificamos que ele pressupõe a relação entre tempo, movimento e alma, ele não via o tempo como algo que pudesse ser compreendido sem estar unido ao movimento. Então o que ele precisava saber era como esta relação se dava.


O movimento

Estamos todos seguros da existência do movimento, quando andamos, a pé ou de carro, quando vemos um barco navegando e em tantas outras coisas. Algumas vezes não vemos o movimento, mas sabemos que ele acontece, como por exemplo, o movimento de uma bala de revolver. Em todos esses movimentos há um “motor” ou “força” que puxa ou empurra, realizando-o. Na época de Aristóteles não existiam carros, aviões, bicicletas ou revolveres, o que dificultava bastante o estudo do movimento. Sendo assim Aristóteles classificou os movimentos em naturais (decorrentes da natureza), onde todas as coisas tinham seu lugar e caso não estivessem neste lugar seriam forçadas a ir para lá, e em movimentos violentos (decorrentes de forças externas ao ser). Para ele o movimento se daria da seguinte forma: translação (ir de um lugar ao outro), rotação (giro sobre si mesmo), geração (nascer e evoluir), corrupção (crescer e morrer) e acidental (mudança). Portanto, vemos que há vários sentidos para o termo movimento, “O movimento está no corpo movido, corpo esse que não se encontra no movimento”, diz Aristóteles. O que faz com que o movimento natural aconteça? Segundo Aristóteles,

não pode ser outro corpo em movimento, pois esse corpo também precisaria ter seu movimento explicado pelo efeito de outro corpo, e assim sucessivamente”.

Sendo assim Aristóteles chega à conclusão que:

deve haver um primeiro motor que não se move, mas que move o mundo de maneira atrativa, e não propulsora. Se este primeiro motor move o mundo sem se mover, significa que ele tem de ser imutável. Sendo um ser imutável, significa que tem de ser puramente imaterial, ou seja, pura forma, puro ato. E se é puro ato, tem que ser perfeito".

Este ser perfeito Aristóteles chamou de Deus. Portanto, Deus, ou o Primeiro Motor, é que explica a eternidade do Universo e seu movimento constante. Este Primeiro Motor (Deus) atrai o mundo por puro amor, e assim o movimento acontece.


O Tempo

O que seria o tempo para Aristóteles? Tempo, para ele, poderia ser fracionado, dividido, incontável e composto de passado e futuro: “O que já foi não o é, e o que será ainda não o foi”, ou seja, conhecemos as partes integrantes do tempo (passado, presente e futuro), todavia sua totalidade e duração exatas nos fogem. O filosofo via o tempo como um ser em potência, para um ser em ato, ou seja, um tempo em potencia para um constante passar a ato. Temos conhecimento do tempo porque vemos que o tempo passa à medida que o movimento acontece então ”tempo é a quantidade de movimento segundo um antes e um depois” (Phys. 219 b1-2). O agora Segundo Aristóteles o passado e o futuro estariam ligados por um ”agora”. Este ”agora“ apesar de não se o tempo em sua totalidade nos permite estudá-lo. Pois o tempo em sua totalidade não é captado pela mente por ser ilimitado. Então este período de tempo delimitado seria a forma de estudar o tempo em si. O filósofo diz “O tempo não é, porque ele será ou já foi” (Phys IV 10217 b35). Poderíamos dizer que o tempo é a soma de vários “agoras”? Não. Pois para Aristóteles o “agora” não tem extensão, mas tem qualidade, sendo uma qualidade do tempo e não uma quantidade.


A Alma

Aristóteles inicia seus estudos partindo de questões levantadas por seus antecessores, tais como Demócrito e Platão, entre outros. No estudo da alma ele chega à conclusão que percebemos o tempo através dos sentidos destas, e a relaciona também com o movimento. Então estes dois objetos estariam diretamente ligados ao tempo. O filosofo dividiu os seres em animados e inanimados, os que possuem o princípio da vida (alma) seriam os animados (com movimentos e sensações) e os que não possuem este princípio seriam os inanimados.

Apesar de o movimento estar ligado à alma, o filosofo separa a alma do corpo e divide a alma em faculdades. São duas as faculdades da alma que seriam capazes de apreender o tempo e o movimento: a intelectiva, de que os seres humanos são dotados, e a sensitiva de que são dotados todos os seres vivos. Sendo assim, somente o ser humano teria a consciência do tempo, por ser o único a ter a capacidade intelectiva. Ele conclui também que a alma não é acionada da mesma forma para suas diversas faculdades. A faculdade intelectiva, por exemplo, de que é dotado o homem, está relacionada à capacidade de Sophía, levando-se em conta que o homem já possui o conhecimento.


Relação entre movimento e tempo

Segundo Aristóteles, todo movimento tem relação com o tempo, ou seja, todo movimento se dá em um determinado tempo, portanto o tempo nunca teria fim já que o movimento também não cessa. O movimento não seria o tempo, mas sim algo que nos permite compreendê-lo. O filosofo não vê o tempo como algo que pudesse ser compreendido sem estar unido ao movimento.


Relação entre a alma e o tempo

Para Aristóteles, o tempo só pode ser percebido através da alma, por ser algo abstrato. O tempo estaria então diretamente ligado a alma, pois ela é “o princípio que enumera o tempo”, sendo a condição necessária para que Possamos apreende-lo. Sendo assim somente os seres humanos (dotados de alma e intelecto) são capazes de percebê-lo. Como se daria a apreensão do tempo? “Quando nós pensarmos os extremos diversos do meio e a alma disser serem dois os agoras um o anterior e outro o posterior, então dizemos isto ser tempo” (Phys. 219 a26-29), ou seja, percebemos o tempo a partir do reconhecimento de dois agoras diferentes entre si. Caso não existisse a alma, o tempo continuaria existindo? Ele diz que “Não é possível haver tempo caso não exista a alma para enumerá-lo” (Phys. 223 a26). Vemos então que a faculdade da alma a que ele se refere é a parte intelectual.


Conclusão

Vimos que segundo Aristóteles, o movimento não depende diretamente da alma, mas será que o tempo depende totalmente dela? Aristóteles diz que sim. Mas e o tempo dos corpos celestes? É verdade que existe o tempo dos corpos celestes, ou seja, o tempo do mundo, portanto se não houver seres animados na terra para contar o tempo através da alma, o tempo continuaria existindo, mas diz Aristóteles que, o que existiria seria um presente contínuo, um eterno agora, já que nossa concepção de tempo é uma relação direta entre passado, presente e futuro. Caso não existisse alma na terra com memória para recordar o passado vivido e a espera do futuro o tempo seria um eterno presente. Sendo assim, o tempo como concebemos hoje, não existiria.


< Bibliografia

BERTII, Enrico. As razões de Aristóteles, 1998 segunda edição

ARISTÓTELES. De Anima.

COMTE-SPONVILLE, André. Ser-Tempo São Paulo 2006 Martins Fontes.