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O AMOR NA SALA DE AULA

Nathália Tomaz
Maria José
Ana Beatriz


Era uma segunda-feira chuvosa quando João acordou, levantou-se e como todas as segundas, sabia que era dia de escola. Arrumou-se, pegou seu uniforme limpo e passado do armário, recolheu seu material, além do trabalho a ser entregue naquele dia e saiu para esperar o transporte escolar que passava em frente sua casa...

Essa história poderia começar assim, mas desse João, não. O nosso João é o mais velho de 4 irmãos que vive em um cômodo com sua mãe. Com 9 anos, João cursa a 4ª série de uma escola pública próxima de sua casa. Pela manhã vai à escola, à tarde e à noite trabalha. Trabalha vendendo doces nos semáforos para ajudar a mãe que além disso também faz faxina.

João é bem conhecido na sua escola, embora não saiba, afinal estuda lá desde seus 6 anos. A diretora o conhece bem, assim como todos as professoras que um dia tiveram João como seu aluno. Ele é famoso porque não sabe ler, nem escrever, não consegue fazer os deveres nem de sala e muito menos de casa, e claro nem os trabalhos de pesquisa. Muitas professoras de reforço já tentaram ajuda-lo, mas suas ausências nas aulas fizeram-nas desistir dele.

João também possui colegas de classe, mas nenhum amigo; afinal já freqüentou quase todas as turmas para que pudesse melhorar o aprendizado, mas nada conseguiu, segundo a diretora.

A situação do nosso João era essa, muitos desistiam dele porque não aprendia como todos os outros alunos e até o próprio João começava a acreditar que ele era incapaz mesmo, e que nunca aprenderia a ler nem a escrever e se tornaria como a mãe.

Nessas trocas de professoras, que eram freqüentes, um certo dia assumiu a sala uma professora bem nova, aparentava uns 20 anos de idade. Assumira o cargo de titular naquela semana mesmo e devia ter ouvido da diretora todas as informações possíveis sobre a turma, inclusive sobre o João.

No primeiro dia de aula, a professora não conheceu João, assim como uns quase 20 dias depois, pois João havia sofrido um pequeno acidente na rua enquanto trabalhava.

Logo, logo, a professora acostumou-se com a turma e já era querida por todos. A lição havia avançado bastante, que a sala passou a ser vista como a mais inteligente da escola. E é nesse contexto que João passa a freqüentar as aulas, se antes ele era excluído, agora que a turma estava bem adiantada ele ficou bem pior. João mais que nunca precisava de ajuda.

Para João, que era um aluno que pouco participava das aulas, a nova professora era apenas mais uma naquele ano, e mais uma na vida dele. Não tinha o menor interesse em assistir às aulas, visto que após o acidente tinha que caminhar lentamente e apoiado, pois havia engessado a perna direita quase completamente, mas à escola ele não faltava. Sua mãe acreditava muito que o futuro dele poderia ser melhor se o filho tivesse estudo.

O primeiro contado do nosso João com a professora nova ocorreu num dia de atividade na quadra. Quando ele chegou a turma toda estava reunida para brincar de pega-pega e logo, João não participou. A professora nova após se apresentar a ele, perguntou se ele queria brincar, João muito pensativo balançou a cabeça que não. Ela não insistiu e ele ficou de fora mais uma vez. Com todos esses anos de exclusão, João já não se sentia parte de um grupo. Era normal ele observar os outros quando não dormia em sala no momento em que o cansaço apertava.

A professora, numa reunião com a diretora comentou sobre o comportamento de João, mas a diretora sempre rude, disse que ele era assim mesmo, só faltava às aulas, era desinteressado e preguiçoso, que não gostava de se envolver em nada. Era normal, esse era o João.

Na verdade esse era o João que ela conhecia. A professora inculcada com sua prática passou a observar mais o aluno para tentar conhecê-lo. João, sempre calado e sofrido, nunca lhe dava abertura, mas a professora que tinha muito amor à profissão, tentou de várias maneiras penetrar na muralha que se erguera e que ele erguera em torno de si, para descobrir um pouco desse aluno ausente.

Ela começou com pequenas tentativas de conversas, mas não surtiram efeito. Perguntava várias coisas para ele, família, irmãos, mãe, sonhos, medos, mas João não falava nada, apenas abaixava a cabeça demonstrando não querer conversa. Muitos dias passaram-se, a professora que já não era mais nova na escola, já estava se referindo ao João como todas as outras professoras que passaram pela vida dele, até que...

Numa tarde após a aula, a professora passeando de carro pára em um semáforo e de repente surge o João oferecendo pacotes de balas. Se esse encontro durou cinco segundos ou dois milésimos, não sabemos, mas que foi o tempo suficiente para que a vida dele e a dela mudasse a partir dali, definitivamente foi.

Os olhares apenas se encontraram e um passou a conhecer melhor o outro. João já via a professora como uma amiga e ela uma possibilidade de mudar a vida dele. Nos dias que se seguiram, a professora aproximou-se de João, apresentou a ele livros coloridos sobre barcos que ele tanto adorava, e ele começou a se abrir. Nascia ali uma amizade.

Com carinho, atenção e respeito à individualidade de João, afinal ele não era uma criança igual as outras,a professora descobriu um pouco da vida dele e a dificuldade que enfrentava em casa com a mãe e os irmãos. Essa vida dura que ele levava, tornou-o muito fechado e maduro demais para idade, pois cuidava de seus irmãos quase o dia inteiro. Trabalhar na rua é estar sujeito a situações de risco, mas era preciso, era a única saída para sobreviver.

Com a nova postura da professora, João passou a ser envolvido nas atividades, pois ela mostrava que ele era capaz e inteligente para muitas coisas. Ela descobriu que João possuía um raciocínio lógico muito desenvolvido, ele fazia cálculos avançados para a idade sem dificuldades. A professora, então se aproveitou dessa habilidade e o nomeou como monitor da turma, que deveria ajudar os colegas nos exercícios. A auto-estima do João estava sendo trabalhada, a grande questão era a leitura e a escrita.

Isso foi facilmente superado, a professora apresentava materiais que instigavam o João, eram reportagens, histórias em quadrinhos, contos, piadas, uma infinidade de recursos que produziam no João sensação de prazer em aprender, e já nem sentia o cansaço e a desmotivação de antes. Em pouco tempo o João mudou, a professora mudou, a turma passou a ser mais unida e até a diretora, rude e irredutível, mudou sua opinião em relação ao João, o aluno desinteressado e ausente.

A história, claro que não termina por aqui, o nosso João um menino carente, com a vida dura e a responsabilidade do mundo, na verdade não é único, mas sim representa uma massa de “Joões” que existe em cada sala de aula, pelos cantos, nas aulas de reforço, exilados, excluídos.

E para cada um há uma professora nova, aparentemente sem experiência de vida, mas cheia de vontade de transformar o mundo com carinho, respeito e amor. Amor aos alunos, amor ao conhecimento e a transmiti-lo, amor à profissão docente e seus obstáculos, amor ao trabalho diário em que cada dia é um novo dia e acima de tudo, amor à educação, pois só a educação é capaz de mudar uma vida, uma pessoa, um país.

Assim como o amor, virtude essa que só se aprende amando e sendo amado. Diferente do dever e da obrigação, o amor é liberdade. Aquilo que fazemos por e com amor sempre se consuma o próprio bem. Deve ser espontâneo e alegre. O amor não é o pai de todas as nossas virtudes, pois então seria o próprio Deus, mas é considerado o alfa e omega delas, sendo aquilo que necessitamos por toda a vida.

O que seria senão o amor da professora para com o nosso João, a única virtude capaz de ultrapassar as barreiras da indiferença, para que nós possamos realmente querer o bem, querer fazer o certo, amar alguém!


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